Minha avó materna teve dez filhos.
O padrão de gênero da nossa língua neutraliza a fatídica composição dessa prole, como se todas as crianças viessem ao mundo simplesmente crianças.
Minha avó teve três filhos, apenas. Todas as outras sete foram filhas.
Sem conceder falsas esperanças a ninguém, elas dominaram quase toda a primeira metade da potência reprodutiva de minha avó. Uma filha após a outra, aquela mulher - a quem fora suprimido o direito de negar qualquer coisa de si exceto seu próprio gozo - negou ao mundo seus varões por quatro vezes consecutivas, e depois mais uma e outra e ainda outra vez. Sete.
Populando de mulheres aquela que era obviamente uma casa de mulheres. E cujas mulheres precisavam por isso mesmo ser sufocadas.
A dor de trazer ao mundo mulheres, sendo mulher. A delícia de trazer ao mundo mulheres, sendo mulher.
Minha mãe. Minhas tias. Minha avó. Mulheres em mim.