Um dia, grávida, fui à casa de um amigo discutir uma
proposta de trabalho com sua irmã. Era um colega de faculdade, eu não conhecia
sua família. Não lembro bem se minha barriga já estava aparente, acho que começava
a ficar mais pronunciada. Contei então da gravidez. Naquele momento, a notícia estava
se espalhando entre os conhecidos.
(Desta vez, espalhou-se lentamente, ao contrário da
primeira. Eu nunca seria o tipo de pessoa que, de maneira deliberada e
planejada, aguarda os primeiros três meses para contar, já que pode “não dar
certo” e é melhor ser discreto no princípio. Mas o fato é que, depois da
experiência do aborto, recebemos a notícia de uma maneira diferente. Tudo
parecia mais incerto e mais íntimo, não havia a vontade de espalhar a notícia aos
quatro ventos. Não sei se é um sentimento mais maduro ou mais amargo, mas assim
foi...)
Todos me parabenizaram. A mãe do meu amigo, que eu não
conhecia, que eu jamais havia visto, ficou exultante e começou a contar o
quanto havia gostado de suas gestações. Ainda me lembro vivamente dela falando
como gostava de sentir “aquela barriga enorme, aquelas crianças crescendo
dentro de mim”. Eu ri, espantada. Espantada!
Achei engraçado, excêntrico. Nunca me havia
passado pela cabeça encarar a gravidez – a gravidez em si, o processo
fisiológico, a sensação física – como algo positivo. Basicamente, a gravidez
era um certo incômodo que é necessário atravessar para ter um filho.
Acho que levei muito tempo para processar aquele momento. Aquela
mulher que eu não conhecia e de cujo nome já não me lembro provavelmente nem
imagina com que gratidão penso nela hoje.
Eu ainda não sabia, mas naquela época uma chave começava a
virar dentro de mim. Eu começava a me aproximar do meu corpo de mulher. A
aprender a não negá-lo. Um aprendizado árduo, pois requer a desconstrução de
toda uma história de negação do corpo, sobretudo do corpo feminino.
E não vai aqui nenhuma apologia à “gravidez de comercial de
margarina”. Esta também é uma negação, na medida em que idealiza o processo. Há
incômodos, objetivos, fisiológicos. Mas quando se trata de seres humanos, nada
é puramente objetivo e fisiológico.
A gravidez (e também os momentos da concepção e do
puerpério) é um momento absolutamente incrível para nos apropriarmos de nosso
corpo, conhecê-lo, reconhecê-lo e amá-lo.
Realmente, que coisa incrível aquela barriga enorme, aquela criança
crescendo dentro de mim.
Obrigada.