Domingo de pão
Era sempre igual, tanto o pão como o ritual.
Primeiro ela tirava a aliança e colocava em algum canto da cozinha.
Não vá a massa entranhar os pequenos brilhantes da única joia. (Às vezes,
depois de tudo, um ligeiro pânico de perdi a aliança. Estava sempre lá; onde mais
estaria?)
Nunca podia ser feito com verdadeiro sossego, pois logo íamos
espiar o processo, perguntando. Minha mãe bem que gostaria desse sossego. Ela
gosta de se mover só e concentrada, livre, na cozinha. Mas nós queríamos meter
as mãozinhas: era mais fácil nos dar o que fazer, e acabávamos invariavelmente
untando a forma. A tarefa das crianças.
A receita não lembro. Se iam ovos, leite? Lembro da farinha
espalhada pelo mármore. Acho que herdei dela essa expectativa de que toda casa
tenha uma grande superfície livre, uma bancada, uma mesa enorme. Pouco importa
o tamanho da família.
O pão era sempre moldado como um falso rocambole,
enrolando-se a massa nela mesma. Deixa crescer enquanto a bolinha sobe. Era absolutamente
fascinante: a pequena bolinha de massa, que podíamos ajudar a enrolar e colocar
no copo com água, de repente subia, e então era hora do forno. Não havia
explicações sobre a densidade do ar e da água, era pura mágica. A mãe dela
usara a bolinha no copo por toda a vida, e ela também fazia assim. Funcionava.
Ainda demora? Já sabemos, pão sempre demora. Mas a entrada no
forno acionava inexoravelmente a ansiedade do pão quase pronto. E ninguém
precisava nos avisar que ficou pronto, pois o cheiro entrava por cada cômodo e
transbordava para o quintal, mais eficiente que sirene de refeitório. Cheiro
de pão quente.
Enfim a manteiga derretendo sobre a fatia fumegante, amornada
apenas o mínimo necessário para nossos dedos. Dizem que pão quente faz mal.
Para nós, era puro deleite.
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